Um "tram-train" para Leiria?
Aproveitar o troço condenado da Linha do Oeste para um sistema de mobilidade urbana
Conforme identifiquei no meu artigo anterior, um consenso alargado favorece a construção de uma estação nova na Barosa para os serviços de Alta Velocidade em Leiria.
Soube, entretanto, que num cenário de estação nova, o projeto prevê a desativação da estação existente e de mais de 10 km da Linha do Oeste, passando a linha convencional a partilhar o alinhamento da alta velocidade entre Regueira de Pontes e a Marinha Grande:
Mapa ferroviário de Leiria. Laranja: linha existente; Vermelho tracejado: linha projetada como parte da LAV Porto-Lisboa. Assinalado a amarelo está o troço a desativar da Linha do Oeste. Mapa de openrailwaymap.org.
Desviar a Linha do Oeste para servir a estação nova resolve o problema da dispersão do serviço ferroviário, concentrando longo curso e regionais num só ponto. Infelizmente, esta solução afasta o serviço ainda mais do centro de Leiria. Reciclando o lema do artigo anterior - “Não choremos sobre balastro derramado” - vejo numa aparente tragédia uma oportunidade para melhorar substancialmente a oferta de transporte coletivo em Leiria. Citando a Câmara Municipal de Leiria, via Jornal de Leiria, a opção Barosa "implica o desenvolvimento de soluções que garantam uma conectividade eficaz à cidade, não apenas no que diz respeito à alta velocidade, mas também à Linha do Oeste, que passaria a utilizar a mesma estação.”
Invoco o exemplo de Karlsruhe, na Alemanha, berço do conceito do “tram-train”. Esta cidade de pouco mais de 300 mil habitantes conta com centenas de quilómetros de via férrea numa rede de veículos que circulam pelas ruas como elétricos, alimentados por fio de catenária de tensão baixa em corrente contínua (afastando o risco de eletrocussão) mas também, como se fossem comboios normais, pela rede ferroviária geral, de tráfego misto, sob corrente alternante:
Veículo da Karlsruhe Stadtbahn. Imagem fornecida à Wikimédia pelo utilizador Wikiolo.
Uma solução semelhante em Leiria permite, sem construção de linha nova, ligar a estação atual de Leiria (Sismaria) e o apeadeiro de Regueira de Pontes, constituindo um sistema de transporte urbano com paragens a construir em: Sismaria-Lis (a sul da estação atual), Rego de Água, Gândara e Ponte da Pedra. Com segmentos relativamente curtos de linha nova, é possível criar uma rede extensa para servir a cidade e a região:
Fases 1 e 2 do sistema tram-train em Leiria. Mapa criado no Google Earth.
Com a construção de cerca de 4000 m de linha nova, é possível ligar o sistema à Linha do Oeste na nova estação da Barosa com uma paragem intermédia, prolongando-se o serviço à Marinha Grande. Bastam 1800 m de linha para conseguir a ligação Sismaria-Terminal Intermodal de Leiria. Para ligar a Marinha Grande e a nova estação na Barosa ao Terminal Intermodal de forma direta, bastaria um segmento de 400 m entre Sismaria-Lis e a Estrada da Estação. Proponho então o seguinte faseamento:
Fase 1:
Construção de novos apeadeiros para a Linha 1 (Marinha Grande - Estação - Sismaria - Regueira de Pontes. Aquisição de novos veículos, com duas opções:
A) Eletrificação do canal desativado da Linha do Oeste sob corrente contínua e aquisição de veículos bimodais aptos para circular sob corrente contínua e alternante.
B) Aquisição de veículos bimodais que circulem com alimentação a baterias no seu canal próprio (na linha desativada) e sob catenária de corrente alternante na linha do Oeste, carregando as baterias. Vantagens: Menor custo de infraestrutura. Menor impacte visual. Desvantagens: maior custo e massa dos veículos.
Paragens da Linha 1:
Marinha Grande, Tojeira, Albergaria, Estação, Barosa, Sismaria-Lis, Sismaria, Rego de Água, Gândara, Ponte da Pedra e Regueira de Pontes.
Fase 2:
Construção da ligação Sismaria - Terminal Intermodal, constituindo a Linha 2:
Regueira de Pontes, Ponte da Pedra, Gândara, Rego de Água, Sismaria, Estrada da Estação, Nova Leiria, Terminal Intermodal
Criação da Linha 3 (Marinha Grande - Estação - Terminal Intermodal), com duas opções: Inversão na Sismaria ou a construção de 400 m de linha nova entre Sismaria-Lis e Estrada da Estação. Com esta segunda opção, as paragens seriam as seguintes:
Marinha Grande, Tojeira, Albergaria, Estação, Barosa, Sismaria-Lis, Estrada da Estação, Nova Leiria, Terminal Intermodal.
Fases 3+:
As três linhas poder-se-ão prolongar nos seguintes sentidos:
- Prolongamento das linhas 2 e 3 pela margem esquerda do Lis ao centro da cidade
- Prolongamento das linhas 1 e 3 a São Pedro de Moel
- Prolongamento das linhas 1 e 2 à Praia da Vieira via Monte Real e Vieira de Leiria.
Cenário de longo prazo para o sistema tram-train (linhas contínuas escuras). Mapa base de openrailwaymap.org.
Vantagens de uma solução ferroviária
Relativamente a uma solução do tipo BRT, esta solução de tipologia tram-train apresenta as seguintes vantagens:
- Serviço com maior pontualidade, capacidade e conforto.
- Menores tempos de percurso e custos de manutenção.
- Menor intensidade de mão-de-obra, criando empregos mais especializados e atrativos.
- Menor extensão de nova infraestrutura de canal dedicado, graças ao aproveitamento da via férrea existente
- Transbordo mais cómodo para os serviços da LAV Porto-Lisboa e Linha do Oeste
- Maior facilidade em garantir plataformas niveladas para acesso fácil por pessoas com deficiência
- Preservação do património ferroviário
- Potencial para desenvolvimento urbano na faixa ribeirinha Sismaria-Regueira de Pontes
- Menor impacte ambiental (menos ruído, sem emissões de partículas poluentes do desgaste dos pneus, possibilidade de circular sem recurso a baterias, maior eficiência energética da tração).
PS: já depois de escrever o artigo, deparei-me com este artigo do João Cunha que propõe um sistema de ferrovia ligeira da cidade à estação nova como forma de atenuar a excentricidade da estação.
Acrescentaria na Linha 3 da segunda fase, a criação de uma estação da Marinha Grande B junto à ZI do casal da Lebre. Deste modo amplificaria a sua utilidade com utentes desde o centro de cidade de Leiria direto ao locais de trabalho. Na mesma linha faria sentido um ponto de acesso no Picheleiro.
Porra, sim sr! Alguem que pensou num projeto como deve ser! Eliminavasse tenho a certeza muito do transito Marinha Grande- Leiria, melhorava-se o transito em Leiria, promovia-se o urbanismo e habitaçao, e a promoçao turistica da cidade , desenvolvimento do centro... Espero que algo do género se concretize!!!! Agora que a estaçao da Barosa já foi confirmada, isto deixa-me mais alegre!